Robo-Advisor ou Human-Adivisor?

É razoavelmente comum encontrar profissionais do mercado financeiro prevendo o fim do modelo tradicional do aconselhamento de investimentos, aquele em que o investidor recorre a um consultor em busca de orientações sobre aonde investir seus recursos. Segundo os defensores desta tese, os millenials tem acessos a uma montanha de informações, são muito bem informados, estão acostumados a utilizar seus smartphones para resolver praticamente todas as demandas do dia a dia, desde a compra de uma pizza até a locação de um carro para uma viagem de férias, e já não gostam tanto de interagir com vendedores, ou até mesmo com pessoas que não tenham tanta afinidade.

Neste cenário, recorrer a um profissional não seria mais necessário. Afinal, além do cliente possuir tanta, ou mais, informação quanto o consultor, este nada poderia acrescentar às recomendações de um algoritmo bem feito.

Antes de prosseguir vamos uniformizar o conceito de Robo-Advisor. Segundo Paolo Sironi, autor do livro Fintech innovation: From robo-advisor to goal based investing and gameficationRobo-Advisor, é uma solução automatizada de auto atendimento em que clientes interagem com interfaces digitais que os orientaram em um processo que se inicia por entender o comportamento do investidor, definir seus objetivos de investimento, desenhar um portfolio e rebalancear as posições, sempre por meio de técnicas e algoritmos de otimização. Usualmente se valem de estratégias passivas de gestão e diversificação como meio de mitigar o risco global da carteira.

A empresa de consultoria Deloitte em seu relatório The Expansion of Robo-Advisory in Wealth Management, classifica a evolução do Robo-Advisory em 4 estágios, que vão se acumulando e aperfeiçoando. Caracterizados, basicamente, da seguinte forma:

Estágio 1 – cliente responde a um questionário, é classificado em um perfil de risco e recebe uma lista de produtos adequados ao seu objetivo e propensão ao risco. A partir de então, ele deve sair em busca destes investimentos e executar as compras.

Estágio 2 – Se desloca da visão produto e adentra pela visão portfolios, que são concebidos como como fundos de fundos. Os questionários ganham uma dimensão mais completa e os clientes são classificados em classes de risco e perfis de alocação. A execução das ordens é embutida nos serviços. A gestão dos recursos e seu rebalanceamento ficam a cargo dos gestores profissionais.

Estágio 3 – A partir de perfis e objetivos bem definidos pelo uso da tecnologia, as decisões de investimento e seus rebalanceamentos passam a ser automatizados.

Estágio 4 – O uso de inteligência artificial e machine learning habilitam a melhor classificação do cliente não apenas de risco, mas também por hábitos e comportamentos, incorporando princípios do behavioral finance. Além disto, incorpora os princípios do goal based investing, em que o cliente passa a ser visto como alguém que pode ter diferentes objetivos para diferentes prazos.

Não parece haver dúvida de que a tecnologia evolua nesta direção e que este avanço suscite novos serviços que alavancarão a experiência do investidor. Estas tecnologias também devem reduzir barreiras de entrada e permitir novos competidores na arena, especialmente as fintechs, reduzindo custos para os investidores e comprimindo margens.

A caminhada nesta direção é inexorável, a tecnologia cumpre seu papel de democratizar o acesso de produtos e serviços a parcelas cada vez maiores da população. Contudo, os partidários mais fervorosos da inevitabilidade da extinção do aconselhamento pessoal, parecem desprezar o fato de que na relação máquina-homem existem dois lados. De certa maneira, porém, parecem enxergar os seres humanos com as lentes da teoria da utilidade esperada, pessoas dotadas de inteligência superior, capacidade de processamento de informação ilimitada e iminentemente racionais. O protótipo do Homo economicus ou como diria Richard Thaler, os Econos.

De forma distinta da teoria da utilidade esperada, que idealiza o homem e prescreve comportamentos de acordo com uma norma racional, as teorias que embasam a economia comportamental são descritivas e se preocupam e explicar como o homem se comporta ao invés de como deveria se comportar.

Neste sentido, o que as teorias de viés comportamental já desvendaram é que a emoção está presente a todo o tempo e que não é possível descrever o comportamento partindo da premissa de que nós seres humanos somos dotados de uma racionalidade ilimitada.

O processo decisório se assemelha mais a um labirinto do que a um túnel. Decisões simples podem ser tomadas de forma simples, sem grande esforço e sem medo. Mas para os casos em que as consequências negativas podem criar dores profundas e os tradeoffs, aquelas escolhas que implicam em abandonar as demais opções, podem causar danos irreparáveis, estas nos tornam tensos e invocam as emoções.

Por esta argumentação, é de se esperar que haja espaço tanto para o Robo-Advisor quanto para a relação entre pessoas. Decisões de baixo impacto, como aplicar uma parcela pequena o capital ou até substancial, como, por exemplo, quando um jovem indestrutível resolve colocar todos seus R$ 10.000 em um investimento, provavelmente serão muita bem assistidas por algoritmo e máquina. Contudo, investir somas substanciais, fruto de uma longa vida profissional e a fonte de renda para uma aposentadoria que se avizinha, não é simples. Nestas horas a emoção surge com força e, para nossa sorte, nós seres humanos queremos interagir com alguém que modere nossa percepção de risco e nos dê algum conforto para decidir.

Publicado em 30/10/2018 no site Arena do Pavini.

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